Um observador anônimo

Não era uma noite especialmente diferente das outras.
A cidade dormia, mas ainda era possível ouvir bêbados cambaleando e resmungando, as músicas abafadas de alguma balada, o motor de uma moto roubada. Os barulhos também não eram especialmente diferentes daqueles das outras noites.
Como sempre, aquele rapaz da esquina saiu de casa perto das quatro da manhã, meio grogue de cansaço. Não sei exatamente o que ele faz todos os dias, não me importa de todo.
Assim como ele, a filha da vizinha aparece na minha visão. De novo. Às vezes me pergunto se ela não cansa de fugir para a casa do namorado secreto toda noite.
E a mãe ainda jura que a garota é uma santa. Pfff...
E eu também estou aqui como sempre, todas as noites. Eu não sou o moço da esquina, que provavelmente acorda cedo para ir trabalhar, não sou uma moça que esconde seus relacionamentos, nem uma mãe iludida. Não sou um bêbado sentado naquela mesa de bar na rua da frente, como aquele cara que está olhando ameaçadoramente para mim. Não sou um ladrão de motos, também.
Eu só estou aqui. Na sacada. Olhando para a minha rua às quatro da manhã.
Acho que eu não tenho muito que fazer.
...
É, eu não tenho muito que fazer.
Mas acho que tudo bem.
Tudo bem.
T
T u
T u d
T u d o
T u d o b
T u d o b e
T u d o b e m
Ou não. Quem saberia, se não sei?

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