Déjà vu

Ela estava preocupada, mas não achava que ia ser ruim. 

O mar era assustador e imenso e perigoso, mas de onde eles estavam ela conseguia ver claramente os peixes e algumas tartarugas (ou melhor, conseguia ver antes de tirar os óculos, agora tudo que enxergava eram grandes borrões de cor). Não havia nem mesmo ondas.

Não era assustador, apesar do frio na barriga. Era apenas preocupante. 

Todos pularam do barco, um a um, rapidamente começando a nadar para um canto um pouco mais afastado da enbarcação, boiando tranquilamente e conversando.

Era sua vez, tinha alguém lá em baixo, na água, esperando que ela pulasse.

Ela não soube exatamente o que a fez pensar que conseguiria, mas pulou. Talvez fosse o pensamento de que já tinha ido em lugares fundos, e conseguira boiar. Talvez fosse só idiotisse.

No momento que ela pulou, percebeu que entrar em um lugar fundo aos poucos era totalmente diferente de cair de uma vez.

O equivalente à comparação entre descer uma escada degrau por degrau e cair dela.

Quase em um déjà vu, se viu caindo na piscina funda de uma chácara, perdendo o controle de seus pés e mãos dentro da imensidão líquida, sem saber o que fazer com seus membros, a visão aos poucos escurecendo enquanto lutava para voltar para cima.

A sensação durou menos de um segundo, mas o desespero continuou ao perceber que, bem, boiar não parecia mais tão fácil quanto se lembrava

E ela segurou na primeira coisa que viu, mas a gravidade continuava puxando ela pra baixo, o que a fazia inconscientemente agarrar com mais força ainda o que quer que estivesse segurando.

Ouviu uma reclamação de dor. Ah, é uma pessoa. Espero que ela não morra comigo. E se via empurrando-se para cima novamente, tentando em vão não empurrar a pessoa para baixo. Então é por isso que os salva-vidas não pegam as pessoas pela frente. Se eles não chegarem perto do jeito certo, eles morrem juntos. O pensamento pareceu ironicamente calmo para o momento, e ela riria irônica se não estivesse ocupada demais quase causando duas mortes.

O desespero parou quando jogaram bóias para ela, que pegou sem nem pensar duas vezes, ainda receosa com a estranha sensação de seus pés não tocarem algo sólido.
Nunca mais pulo dentro da água.

Quando perguntaram se ela estava bem, ela disse que sim, e a diversão continuou como se aqueles minutos (segundos? Horas? Não saberia dizer) de desespero nunca aconteceram.

Mais tarde, ela riu, brincando ao dizer que esse era um dos riscos de ir para uma praia com os amigos quando era a única do grupo que não nadava e não enxergava bem.

Ela disse, com toda certeza, que entraria com eles de novo na água no dia seguinte, afirmando que desceria pelas escadas na lateral da embarcação, com as bóias para ajudar.

Negou as aulas de natação oferecidas por eles, apesar de tudo. Não achava necessário que aprendesse a nadar, já que não era realmente fã de estar cercada de líquido por todos os lados. Além disso, sabia que seu problema não era não saber nadar.

A negligência à natação não era uma causa, e sim uma consequência. Maldito déjà vu.

Mas não queria falar disso, então só ria e negava. Não achava necessário quando não tinha uma rotina que exigisse a habilidade de se movimentar dentro da água.

Enquanto tivesse prudência e algumas bóias, não precisaria se preocupar com desesperos marítimos, e muito menos com memórias antigas e involuntárias.

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